Prática de percepção: SABOREAR
Todos os bichinhos se nutrem das coisas que a Dama lhes oferece.
As tapeçarias estão cheias de arvores frutíferas e de ervinhas para os bichos. O macaco sente prazer com sua comida, a Dama olha com carinho para o pássaro adestrado que pousa na sua mão, e o Leão coloca a língua para fora.
A ideia destas práticas simples é prestar atenção às nossas sensações corporais e percepções, e conectá-las a nosso mundo interno. Se quiser mais informações sobre isso, clique AQUI.
Não é preciso ter feito as práticas anteriores para fazer a de hoje, que consiste em:
1. AFASTAR OUTROS ESTÍMULOS E CONCENTRAR-SE SÓ NISSO. Não mexer nem olhar para o computador, celular, televisão, desligar o som, não falar.
2. COMER OU BEBER ALGO DE QUE SE GOSTE MUITO, LENTAMENTE E PRESTANDO ATENÇÃO. Qualquer comida, qualquer quantidade.
3. DAR QUALIDADES ÀS SENSAÇÕES QUE ESTÁ SENTINDO, PERCEBER OS SENTIMENTOS QUE ISSO TRAZ E FAZER ASSOCIAÇÕES EMOCIONAIS. Eu sigo mais ou menos o roteiro abaixo, mas não é preciso responder todas essas questões. Outra opção é se concentrar em apenas uma ou duas das perguntas.
Para ilustrar coloquei o texto de um exercício meu abaixo.
4. DURAÇÂO: ALGUNS MINUTOS. É legal repetir variar esse exercício variando os alimentos preferidos que comemos. Além do mais, é uma delicia fazer isso…
Roteiro: Esse alimento é doce, salgado, gorduroso, seco, acido, apimentado, pastoso, ácido, liquido…? Costumo comer isso com frequência? É algo que me faz sentir bem ou me sinto culpada por comê-lo, ou ambos? É algo que me conforta ou me estimula? Sinto-me nutrida por ele? Preciso de grande quantidade para sentir-me satisfeita com ele? Prefiro come-lo sozinha ou com outras pessoas? Que sensação ele deixa depois que acabo de comê-lo? Ele me lembra alguma época da vida, pessoa, lugar, situação? Qual dessas coisas poderia acompanha-lo: uma musica, um cenário diferente, um objeto, uma pessoa, um sentimento? Tenho vontade de oferecê para outra(s) pessoa(s)?
E se passarmos a sentir ainda mais prazer com um alimento de que gostamos, OBA! Se nosso paladar ficar mais sensível a sabores que antes passavam batidos, e se precisarmos de menos quantidade para nos satisfazer, OBA OBA! É sinal de que estamos nos alimentando com os frutos das árvores da Dama!
Caju com vareniki
Para começar a refeição, cajú amigo, uma espécie de batida de caju com vodka.
Ele chega quase dourado, começando por tons de amarelo clarinho em cima, onde o gelo flutua, e se adensa para o fundo, onde espremo com a colher alta a fruta quase ocre, desmilinguida o bastante para adoçar o mundo inteiro.
E bebo dessa maravilha gelada, que continua reverberando língua abaixo muito depois do gole, naquela puxadinha do caju que vai acordando umas coisas que eu tinha esquecido que estavam aqui dentro.
Esquecido como estava até esse momento aquele tempo que costumava tomar isso com os amigos de boemia, a Patricia, a Lurdinha…
Depois, pesco e parto a fruta com a colher, e lambo, mastigo, como e engulo.
Tem gosto de vida noturna, conversa e festa, gosto que vem da boca, do afeto e da alma ao mesmo tempo.
Peço a seguir um vareniki, tipo de massa de batata recheado de batata, pleonasmo da cozinha judaica que combina com essa descendente de italianos que sou. Coberto de cebola, ele vai desmanchando lento e morno na minha boca.
Minha mãe diz: que coisa boa, hum…
Muito boa. Fecho os olhos e descubro como me sinto grata.
Texto de Beatriz Del Picchia, imagens das tapeçarias da Dama e o Unicórnio expostos no Museu de Cluny, Paris.