Poesia é remédio – MOTIVO, de Cecília Meireles
Às vezes, meio que me perco de mim, na confusão desse mundo demandante de coisas, de atividade incessante, de muito barulho e de excesso de informação inútil. Nesses momentos, o que preciso é da clareza e da simplicidade da aceitação de um destino, daquilo que é a essência de uma vida, da BLISS. Leio, então, esse poema da linda Cecília Meireles, de preferência tomando uma taça de um bom Merlot.
Motivo
Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
— não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.
Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
— mais nada.
E depois, para a segunda taça, leio essas palavras com que ela comprova que sua obra, sua vida e sua BLISS são feitas da mesma “matéria-prima”.
“Nasci aqui mesmo no Rio de Janeiro, três meses depois da morte de meu pai, e perdi minha mãe antes dos três anos. Essas e outras mortes ocorridas na família acarretaram muitos contratempos materiais, mas, ao mesmo tempo, me deram, desde pequenina, uma tal intimidade com a Morte que docemente aprendi essas relações entre o Efêmero e o Eterno.
(…) Em toda a vida, nunca me esforcei por ganhar nem me espantei por perder. A noção ou o sentimento da transitoriedade de tudo é o fundamento mesmo da minha personalidade.
(…) Minha infância de menina sozinha deu-me duas coisas que parecem negativas, e foram sempre positivas para mim: silêncio e solidão. Essa foi sempre a área de minha vida. Área mágica, onde os caleidoscópios inventaram fabulosos mundos geométricos, onde os relógios revelaram o segredo do seu mecanismo, e as bonecas o jogo do seu olhar. Mais tarde foi nessa área que os livros se abriram, e deixaram sair suas realidades e seus sonhos, em combinação tão harmoniosa que até hoje não compreendo como se possa estabelecer uma separação entre esses dois tempos de vida, unidos como os fios de um pano.”
Queridas,
Adorei esta mensagem. É pura beleza e alegre expressão da alma que viveu tristezas.
Obrigada por me fazer recordar este poema que muito já me acompanhou e do qual eu andava esquecida.
Grande Dia de frio e céu anil!
Um abraço da Neiva
Belissimo.