Joseph Campbell : “mitologia é psicologia confundida com biografia, história e cosmologia”
Por que ainda hoje a literatura e o cinema fantástico (Crepúsculo, Game of Thrones, Once upon a time, Harry Potter, etc) fazem tanto sucesso?
Sem esgotar o assunto, nesse trecho do livro “O herói de mil faces”*, Campbell explica que os mitos e contos de fadas permitem que a gente expresse desejos, temores e outros sentimentos que estão lá no fundão inconsciente de todos nós.
“O intelectual moderno não encontra dificuldades em admitir que o simbolismo da mitologia se reveste de um significado psicológico. Está fora de dúvidas, especialmente depois do trabalho dos psicanalistas, que tanto os mitos compartilham da natureza dos sonhos, quanto os sonhos são sintomáticos da dinâmica da psique.
Sigmund Freud, Carl G. Jung, Wilhelm Stekel, Otto Rank, Karl Abraham, Géza Róheim e muitos outros desenvolveram, nas últimas décadas, um moderno corpo, vastamente documentado, de interpretações de sonhos e mitos; e, embora tenham desenvolvido trabalhos que apresentam amplas divergências entre si, esses doutores se unem num grande movimento moderno por meio de um considerável conjunto de princípios comuns.
Com a descoberta de que os padrões e a lógica do conto de fadas e do mito correspondem aos do sonho, feita por eles, as quimeras há muito desacreditadas do homem arcaico voltaram, de modo dramático, ao plano principal da consciência moderna.
Nos termos dessa concepção, há razões para crer que, através dos contos maravilhosos — cuja pretensão é descrever a vida dos heróis lendários, os poderes das divindades da natureza, os espíritos dos mortos e os ancestrais totêmicos do grupo —, é dada uma expressão simbólica aos desejos, temores e tensões inconscientes que se acham subjacentes aos padrões conscientes do comportamento humano. Em outras palavras, a mitologia é psicologia confundida com biografia, história e cosmologia.
O psicólogo moderno tem condições de retraduzi-la em suas denotações próprias e, desse modo, recuperar para o mundo contemporâneo um rico e eloqüente documento das camadas mais profundas do caráter humano. Aqui são exibidos, tal como num fluoroscópio, as revelações dos processos ocultos do enigma Homo sapiens — ocidental e oriental, primitivo e civilizado, contemporâneo e remoto.”
* Ed. Cultrix/Pensamento