O lobo de Wall Street e a morte
Jordan Belford é um ex-corretor da bolsa de New York que fica riquissimo as custas de enganar pequenos investidores. Em três horas de exibição, acompanhamos sua trajetória desde o modesto início até as dificuldades que vai ter com a justiça. Dessas 3 horas, nenhum minuto é reservado aos que perderam tudo com ele, mas muitos minutos ao uso que ele faz do dinheiro: orgias, drogas e abusos de todo tipo.
Apesar de baseado na autobiografia real de Belford, é uma obra quase caricata nas imagens, cenas e personagens. Diminuindo assim as nuances de bem e mal, algumas questões surgem de forma crua.
Belford baseia seu engodo na capacidade de vender ilusões a outros. Seus discursos para os corretores me lembraram alguns filmes que mostram líderes militares estimulando os soldados a matar e morrer, muitas vezes (a maioria?) por guerras ou causas absurdas. Aqui a causa é enriquecer, matar é ferrar o outro, e morrer é matar a própria integridade. A arma é a palavra, vendendo a desavisados o sonho, que junguianos poderiam chamar de sombra, de ficar rico sem esforço. Mas o imaterial (e simbólico) dinheiro é um deus cruel: – Aqui o único dinheiro real é a comissão do corretor, explica um deles.
A forma de gastar a fortuna parece uma caricatura de todos os valorizados sonhos de consumo. Quando o sexo, drogas e artigos de luxo ficam banais, ele parte para as distorções sem limite desses mesmos artigos, até o ponto em que o próprio corpo vira um objeto de consumo que se estoura pelo excesso.
Mais do que qualquer ser ou objeto, o grande barato aqui é o estado de consciência que consegue obter. – A cocaína é o motor desse trabalho, afirma o mentor de Belford ao instrui-lo. Assim, certa hora em que está correndo risco fatal, ele exclama desesperado não pelo medo, mas pelo estado em que se encontra: – Não vou morrer sóbrio! Na verdade, Belford parece caminhar alucinadamente com a morte ao lado; talvez, mais do que o dinheiro, ela seja sua verdadeira paixão e estimulante rival no negócio da vida.
Não é extraordinária e acho que poderia ser mais curta, mas essa obra, dirigida por Martin Scorsese com um excelente Leonardo Di Caprio no papel principal, dá o que pensar.
Texto de Bia Del Picchia