MULHERES MARCANTES: Mary Wollstonecraft (1759/1797)
Normalmente não postamos aos domingos, mas hoje, 8 de março, dia Internacional da Mulher faremos uma exceção.
Queremos homenagear as pioneiras na luta por nossos direitos, as quais todas nós devemos tanto, contando um pouco da vida de uma delas, tão importante e pouco conhecida: MARY WOLLSTONECRAFT!
Mary Wollstonecraft foi uma escritora inglêsa do século XVIII defensora dos direitos das mulheres.
Durante a sua breve carreira, escreveu romances, tratados, um livro sobre viagens, uma história sobre a Revolução Francesa, um livro sobre comportamento social, e livros para crianças.
O trabalho mais conhecido dela é A Vindication of the Rights of Woman (1792), no qual ela defende que as mulheres não são, por natureza, inferiores aos homens, mas apenas aparentam ser por não poderem ter acesso à educação. Prega que, tanto os homens como as mulheres, devem e merecem ser tratados como seres racionais e iguais, e concebe uma ordem social baseada nessa premissa.
Mary nasceu em Londres, segunda de sete filhos de Edward John Wollstonecraft e Elizabeth Dixon. Embora a sua família tivesse um rendimento razoável, durante os primeiros anos da sua vida, o seu pai foi esbanjando-o em negócios especulativos. Aos poucos, a família foi tornando-se financeiramente instável. O pai tornava-se violento em episódios de alcoolismo e batia na mãe. Adolescente, Mary costumava ficar deitada à porta do quarto da sua mãe para a proteger.
Durante os primeiros anos da sua vida, Mary teve duas amizades que moldaram a sua personalidade. A primeira foi com Jane Arden. As duas amigas liam livros em conjunto e assitiam a palestras dadas pelo pai de Jane, um filósofo e cientista. Wollstonecraft divertia-se na atmosfera intelectual da casa dos Arden.
A segunda, e mais importante amizade foi com Frances Blood; ela atribuia a Blood a abertura da sua mente. Descontente com a sua vida caseira, Wollstonecraft decidiu dar um rumo à sua vida em 1778, e aceitou um emprego como dama de companhia de Sarah Dawson, uma viúva a viver em Bath. Em 1780, Mary regressa a casa para tratar da sua mãe que estava morrendo. Depois da morte Wollstonecraft foi viver com os Blood. Ao longo dos dois anos que passou com a família, Mary apercebeu-se que tinha ideias diferentes de Fanny, a qual estava mais ligada aos valores tradicionais femininos que ela, mas permaneceu ligada a Fanny e a sua família por toda a sua vida.
Wollstonecraft tinha imaginado viver uma vida num contexto feminino e utópico com Fanny; fizeram planos para arrendar quartos e para se apoiarem, mutuamente, emocional e financeiramente, mas isso foi impossível dada a realidade das condições econômicas. Para poderem ter uma base financeira segura, Mary, as irmãs e Fanny, criaram uma escola. Mas logo depois Fanny se casou e foi para Lisboa cuidar de sua saúde, mas ficou grávida e se saúde piorou. Mary abandona a escola (que com isso se encerra) para ir cuidar da amiga, mas essa acaba falecendo.
Este período da sua vida serviria de inspiração para o seu primeiro romance, Mary: a Fiction (1788).
Depois da morte de Fanny, os amigos de Mary ajudaram-na a arranjar um lugar como educadora particular das filhas da família anglo-irlandesa Kingsborough, na Irlanda. Embora não se desse bem com Lady Kingsborough, as crianças viam-na como uma instrutora inspiradora; mais tarde, Margaret King diria que ela “lhe tinha libertado a mente de todas as suas superstições”. Algumas das experiências de Mary naquele ano iriam servir de inspiração para o seu livro de história infantis, Original Stories from Real Life (1788).
Frustrada pelas poucas opções de carreira para as mulheres mais pobres, mas respeitáveis — um impedimento que Mary descreve com eloquência num capítulo de Thoughts on the Education of Daughters —, ela decidiu, apenas um ano depois como educadora, partir para uma carreira como autora. Nessa época as mulheres não viviam da escrita. Como escreveu para a irmã, em 1787, tentava ser “a primeira de um novo gênero”.
Mudou-se para Londres e, apoiada pelo editor liberal Joseph Johnson, encontrou um lugar para trabalhar e viver de forma independente. Aprendeu francês e alemão, e traduziu textos, fez trabalhos de revisão, principalmente de romances, para a revista de Johnson Analytical Review. O universo intelectual de Wollstonecraft alargou-se durante este período, com o trabalho de revisão que realizava, e com os novos conhecimentos que vinha adquirindo. Frequentava os famosos jantares de Johnson, e conheceu personagens como o radical Thomas Paine e o filósofo William Godwin.
Ela escreveu Vindication of the Rights of Men (1790) em resposta à crítica conservadora de Edmund Burke da Revolução Francesa , tornando-se famosa de um dia para o outro. Mary aproveitou as ideias que tinha salientado nesse livro em outro: A Vindication of the Rights of Woman (1792), o seu trabalho mais famoso e influente.
Enquanto estava em Londres, Mary teve uma relação com o artista Henry Fuseli, embora ele fosse casado. Ele ficou, como escreveu “extasiada pelo seu talento, a grandeza do seu espírito, aquela rapidez de compreensão, e aquela encantadora simpatia”, mas acabou terminando sua relação com Mary.
Ela decide então viajar para França para participar nos acontecimentos revolucionários que ela tinha citado em seu livro. Chega em Paris em dezembro de 1792, um mês antes da execução de Luís XVI. A França encontrava-se no meio de um turbilhão de violência. Mary juntou-se ao círculo de expatriados da cidade e acaba conhecendo e se apaixonando por Gilbert Imlay, um aventureiro norte-americano. Pouco tempo depois, ficou grávida e, no dia 14 de Maio de 1794, Mary deu à luz a sua primeira filha, Fanny. Enquanto estava em Le Havre, na região Norte da França, Mary escreveu uma história dos primeiros dias da revolução, An Historical and Moral View of the French Revolution, que foi publicada em Londres em 1794.
À medida que a situação piorava, a Grã-Bretanha declarou guerra a França, colocando, assim, os cidadãos britânicos vivendo nesse país em situação de grande risco. Para proteger Wollstonecraft, Imlay registou-a como sua esposa, apesar de não serem casados. Mas Imlay acabou por deixá-la.
Regressou a Londres em abril de 1795 em maio tentou suicidar-se por ter sido abandonada. Numa última tentativa para conquistar Imlay, Mary dedicou-se aos seus negócios, em particular na Escandinávia, tentando recuperar algumas das suas perdas. Wollstonecraft realizou esta perigosa viagem tendo apenas como companhia a sua filha e uma criada. Mary fez um relato das suas viagens e dos seus pensamentos nas cartas que enviou a Imlay, sendo que muitos dos quais seriam publicados como Letters Written in Sweden, Norway, and Denmark, em 1796.
Quando regressou a Inglaterra, e tomando consciência de que a sua relação com Imlay tinha terminado, tentou, de novo, suicidar-se.
De forma gradual, Wollstonecraft regressou à sua vida literária e começou a namorar seu velho conhecido William Godwin,um dos pais do movimento anarquista Quando Mary ficou grávida, decidiram casar-se para que o seu filho fosse considerado legítimo. O casamento acabou revelando que Mary nunca tinha sido casada com Imlay, e, como resultado disso, ela e Godwin perderam muitos amigos. Além disso Godwin foi criticado por ter se casado, pois tinha defendido a abolição do casamento no seu tratado filosófico Political Justice. Depois do casamento em 1797, mudaram-se para duas casas contíguas, para que ambos mantivessem a sua independência; era habitual comunicarem-se por carta.
No dia 30 de Agosto de 1797, Mary deu à luz a sua segunda filha, Mary. Embora, de início, tudo estivesse correndo bem, a placenta rompeu-se durante o nascimento e criou uma infecção; as infecções puerperais eram habituais e, habitualmente, fatais no século XVIII. Após vários dias em sofrimento, Mary Wollstonecraft morreu de septicemia no dia 10 de Setembro.
A sua filha Mary Wollstonecraft Godwin também se tornaria uma escritora, com o nome de Mary Shelley, a autora de Frankenstein.
Até meados do século XX, a vida dela, que incluiu comportamentos e relações pessoais não-convencionais, foi alvo de mais atenção do que os seus trabalhos. Contudo, com o advento do movimento feminista, a defesa que fez da igualdade das mulheres e as críticas às convenções sobre a natureza feminina tornaram-se cada vez mais relevantes. Atualmente, Mary Wollstonecraft é vista como uma das fundadoras do feminismo filosófico e é habitual muitas feministas citarem tanto a sua vida como a sua obra como influências importantes.
No Brasil, Nísia Floresta* foi a responsável pela primeira tradução e adaptação no país, da obra de Mary Wollstonecraft, ainda no século XIX.
* Nísia também foi retratada nessa série “Mulheres Marcantes”