26 de junho, dia das avós e avôs
Envelhecer é problema? Antes de responder com um SIM, leia essa maravilhosa declaração de amor às avós. Ela comemora não apenas nossa ancestralidade mas o amor, a ancestralidade e os processos da vida em si mesmos.
“Eu amava todos os meus avós mas eu amava o corpo das minhas avós, ambas padecendo de artrite, como eu agora. Eram frágeis e determinadas no modo de se movimentarem, e, a partir do momento em que cresci e fiquei forte o suficiente para ajudar de alguma maneira, usaram meu corpo como suporte ou alavanca. Desde cedo me ensinaram como tocar a dor e confortar porque estavam à ingênua mercê do meu amor. Com elas, muito mais do que com a minha maravilhosamente corpulenta e competente mãe, aprendi a íntima proximidade da carne.
Quando, já adolescente, sentia uma timidez física em relação à minha mãe, sempre tinha doces desculpas para tocar minhas avós, pentear seu cabelo, ajudá-las a se vestirem, escolher dos anéis os que atravessariam as juntas inchadas do que, para mim, eram mãos lindas, ainda hábeis no manejo da linha e da agulha, das cartas, das flores, precisas no atendimento de pedidos.
Para mim, o rosto delas era mais encantador do que todos os outros da minha infância porque tinham sido feitos, podiam ser entendidos como não era possível com o rosto em branco das outras crianças, e até como os de meus pais que também eram impenetráveis, uma vez que eles ainda não se conheciam nem acobertavam a própria auto ignorância o melhor que podiam. Minha mãe tem esse rosto extraordinário agora.
Tornar-me uma mulher idosa sempre foi a minha ambição, e pode ser que a minha existência deva ser curta o bastante para que se acelere o processo necessário para tanto. Tive um longo aprendizado como amante e, do modo que me é possível, ainda desempenho os padrões da corte e da sedução, mas estou chegando numa época que devo ser a querida das crianças e dos jovens, os quais irão avaliar sua confiança em termos de minhas necessidades cada vez maiores.
Assim como minhas avós me ensinaram as verdadeiras lições do amor erótico com suas carnes maravilhosamente carentes e seus rostos expressivos, assim desejo ensinar às crianças que amo que elas são capazes de ternura e força, de conhecimentos, por causa do que virem no meu rosto, nítido na dor e no deslumbramento, firme no intento de praticar a vida enquanto ela me durar”.
Fonte: livro Espelhos do Self