O Feminino e o Sagrado um jeito de olhar o mundo

O Feminino e os Livros: CASA DE BONECAS

O primeiro livro que vou indicar nessa série do “Feminino e os livros”escrito por um homem, não é um romance, nem uma biografia, nem ensaios, nem livro de psicologia: é uma peça de teatro. 
CASA DE BONECAS, foi escrito pelo norueguês Henrik Ibsen em 1879. O exemplar que tenho foi editado em 1983, pela Editora Abril, numa série dedicada a peças teatrais. Essa edição conta também com uma pequena biografia de Ibsen e traz fotos (lindas!) de algumas montagens famosas da peça: pela maravilhosa Liv Ullman e o meu querido “Jack McCoy”, do Law & Order, Sam Walterston, de Claire Bloom e Anthony Hopkins e de Tonia Carreiro e Rubens de Falco. Mas existem inúmeras edições disponíveis. 

 A peça é em três atos e conta a história de Nora, esposa de Torvald e mãe de seus 3 filhos. Nora está casada há 8 anos e é tratada pelo marido como uma criatura frágil, infantil, sem nenhuma capacidade de qualquer pensamento próprio. É super mimada por ele que a chama de esquilinho, cotovia, bonequinha…. E Nora é ingênua, desinformada, imatura, quase leviana. 
Mas, pela trama, que não cabe contar aqui,  para salvar a vida do marido, acaba cometendo uma fraude e fica nas mãos de um agiota e chantagista. O marido descobre e aí a trata como uma louca, desmiolada, incapaz: todo seu amor e cuidados desaparecem quando pensa que os atos dela podem prejudicar sua carreira. Depois as coisas se resolvem e ele volta atrás, diz que a perdoa e que a fragilidade e a inferioridade (!!!) dela o faz amá-la mais ainda. 
O choque de tudo isso desperta nela a consciência de  que não sabe quem é, não sabe viver,  de que não é nada e que a relação que tem com o marido só agravou isso. Faz um discurso dilacerado sobre isso para ele e diz que não pode educar os filhos sem se educar primeiro antes. Resolve então abandoná-lo, a casa e aos filhos para descobrir quem de fato é. Diz ao marido: “Eu acredito que antes de tudo eu sou um ser humano, exatamente como você é ou, pelo menos, eu devo tentar me transformar nisso”. 
E isso em 1879! 

Esse texto é muito importante para mim, porque foi o primeiro despertar consciente sobre a importância de me pensar mulher mas como gente/indivíduo, muito antes do que como mulher namorada/esposa de um homem. Acho que foi meu início de um feminismo consciente, que já se esboçava, mas ainda de forma muito confusa, na infância e adolescência. 

Eu não vi nenhuma montagem teatral da peça, mas vi o filme em 1973, quando eu tinha 21 anos. Era um filme inglês, dirigido por Joseph Losey e com Jane Fonda como Nora. Me lembro da linda Jane Fonda, toda vestida de peles, com a mala na mão, fechando a porta de casa e indo em busca de si mesma. Essa cena me causou tal impacto que até hoje, 40 anos depois, tenho ela perfeitamente guardada na memória! 

Se algum dia houver uma nova montagem de CASA DE BONECAS vale a pena conferir e se, de alguma forma, se conseguir a filme de 1973 também. Mas, pode enquanto isso ficar com o texto: é primoroso e apesar dos seus 134 anos, em muitos sentidos, atual! 

 

 

Texto de Cristina Balieiro

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