O Feminino e o Sagrado um jeito de olhar o mundo

As antigas damas japonesas, de Ana Hatherly

Adoro a tradicional estética japonesa. Quando estive no Japão, amei ainda mais as construções antigas, os jardins, o Zen, as sedas, as pinturas, os haicais, o sushi, enfim, tudo. Mas ao ler esse poema da Ana Hatherly, artista plástica e poeta portuguesa , não pude deixar de pensar na raiva que existe por trás de toda submissão, por estética que seja, no caso das doces  gueixas de antigamente . Mas nada de radicalismos: nem tudo é raiva e revolta, nem tudo é delicadeza e poesia. Somos, graças a Deus, uma grande mistura.

As antigas damas japonesas
distraidamente
agitavam seus leques
no solitário mundo dos biombos

A distração
porém
é uma forma superior de ocultação
e
na aridez
do seu íntimo domado
o rugido da raiva
estava contido
artisticamente comprimido
no extravagante cinto
que traziam
atado nas costas

Tocavam
dançavam
serviam o chá de joelhos
num secular sequestro

Mas às vezes
num intervalo do desvelo
da honra e do pudor
descobriam
o esquisito sabor
que tem o crime

Texto de Bia Del Picchia, poema colhido em SIBILA, revista de poesia e cultura, n. 5/2003 .

2 comentários

  1. Nossa Bia, esse poema é lindo e intenso…mostra o lado B…
    Você já leu O Livro do Travesseiro de Sei Shonagon? Foi escrito há mil anos, no século X, por uma dama da corte da imperatriz e mostra bem o cotidiano dessas mulheres que não era tão suave assim.
    É um livro maravilhoso, sua escrita é em prosa poética e no meio tem muitos haikais.
    Bjs

  2. Ja anotei para ler, obrigada Cristiane!

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