A deusa egípcia da noite
Nut é a deusa egípcia do céu noturno, a deusa do firmamento cheio de estrelas, a que abarca em seu regaço toda a vida da Terra. É de seu Útero Celeste que toda vida nasce e renasce. É também a mãe dos mortos, aquela que cuida de suas almas: acreditava-se que ela estendia a mão aos que tinham morrido, consolando-os e os colocando como estrelas em seu imenso corpo celeste, à espera da reencarnação.
É uma das mais antigas deusas dessa tradição, com origem na mitologia da cidade de Heliópolis, uma das principais do Egito Antigo, localizada a cerca de 10 quilômetros da hoje cidade do Cairo. Segundo a religião egípcia, foi em Heliópolis que teve início a Criação do Mundo.
Nut é filha de Tefnut, a deusa do ar úmido e de Chu, o deus do ar seco, ambos filhos do Grande Criador, o deus Sol Rá. Diferente de muitas tradições, onde normalmente há uma Mãe Terra e um Pai Céu, como por exemplo para os gregos Gaia e Urano, na mitologia egípcia há uma mãe Céu/Noite, Nut e um pai Terra, Geb. Juntos, Nut e Geb geraram os quadrigêmeos Osíris, Set, Ísis e Néftis.
Nut e seu esposo Geb, seus pais Tefnut e Chu, seu avô, Ra, o Deus Sol e seus filhos Osíris, Set, Ísis e Néftis formavam a enéade mais importante da antiga religião egípcia. Enéade, na mitologia desse povo era um agrupamento de nove divindades, geralmente ligadas entre si por laços familiares.
Nut era representada como uma imensa mulher nua, de corpo muito alongado e pele escura. Seu enorme corpo era todo coberto de estrelas e arqueado sobre a Terra, com a ponta dos pés tocando o horizonte oriental e a ponta das mãos o horizonte ocidental. Seus pés e mãos eram os pilares que sustentavam o Céu em cima da Terra.
Parte do hieróglifo de seu nome é um pote com água, que simbolizava seu grande e abundante ventre: seu Útero Celeste, que contém as águas da vida.
Um dos mitos conta que todas as noites, quando Rá, o deus Sol desaparecia no horizonte é porque ele havia entrado com sua barca* dentro do corpo de Nut através da sua boca. O deus Sol então percorria navegando o corpo de Nut durante a noite, descansando parte do tempo em seu ventre, chamado de gruta secreta. E no início de cada manhã, Nut dava à luz a Ra a partir de suas coxas. Dessa forma ele diariamente renascia como o radiante disco solar. Nesse relato, a manhã simbolizava a renovação de toda a Criação, além de ser também uma analogia com a ressureição dos mortos, crença fundamental para a antiga religião egípcia.
Em outro mito Nut é representada como a Grande Vaca Celeste de cujas tetas nascia a Via Láctea e que carregava o deus Sol Rá montado em suas costas, quando ele desaparecia da Terra no final do dia. Durante a noite o Sol viajava pelo firmamento cavalgando Nut como Vaca Celeste, para renascer pela manhã, num outro relato simbólico do ciclo morte-renascimento.
No Egito Antigo a religião era parte integrante da vida política e social. Durante todo o ano ocorriam numerosos festivais religiosos que serviam para que as pessoas tivessem de forma mais íntima o contato com os deuses, consultassem seus oráculos, dessem graças pelos favores recebidos e pedissem novos favores divinos. Nut era festejada especialmente no chamado “Festival das Luzes”. E em seus inúmeros templos apenas mulheres, suas sacerdotisas serviam e cuidavam dos altares e rituais.
Mesmo com a diminuição do poder divino feminino nas dinastias faraônicas posteriores, Nut continuou a ser reverenciada, principalmente devido à sua importância nos ritos funerários e em suas representações nas tampas dos sarcófagos, tanto dos faraós e seus familiares, quanto de outros egípcios importantes como sacerdotes, líderes militares e escribas. As representações de Nut nas urnas mortuárias asseguravam a proteção após a morte e a certeza do renascimento: o sarcófago se tornava o útero que continha aquele que deveria ser renascido sob a proteção da deusa.
Trechos do livro O LEGADO DAS DEUSAS 2