A perda da ilusão e o ganho do símbolo
Quando criança eu adorava o Natal.
Tanto a noite do dia 24, como o almoço do dia 25, normalmente acontecia na minha casa, com inúmeros primos e tios, tanto da família da minha mãe como do meu pai.
As tensões familiares, tão comuns em ocasiões como essas, não eram sentidas por mim quando menina, então tudo era só festa!
Mas quem eu amava com veneração quase absoluta era o Papai Noel!
Na tradição da minha família, ele deixava os brinquedos ao pé da cama, onde colocavamos nossos sapatos para ele saber onde deixar os presentes. A gente nunca sabia se ele podia trazer tudo o que pedíamos (afinal, ele tinha que dar presente para muitas crianças e precisava fazer uma seleção), então sempre havia uma surpresa ao acordar.
Mas não eram só os brinquedos trazidos que me faziam amar aquele figura, mas acima de tudo sua mágica! Na minha cabecinha ele ocupava o lugar de um deus muito rico, de imensa bondade e poder, que me emocionava profundamente, me fazendo sentir pertencer a um mundo extraordinário!
Mas não eram só os brinquedos trazidos que me faziam amar aquele figura, mas acima de tudo sua mágica! Na minha cabecinha ele ocupava o lugar de um deus muito rico, de imensa bondade e poder, que me emocionava profundamente, me fazendo sentir pertencer a um mundo extraordinário!
Perder a ilusão em sua existência foi uma das minhas primeiras grandes dores! Eu devia ter uns seis ou sete anos, quando acordei de madrugada e vi meu pai carregando minha bicicleta tão aguardada.
Fiquei imensamente triste: parte da minha tenra meninice morreu ali!
Mas não pensem que sou contrária a acalentar sua lenda para as crianças! Falei do Papai Noel para minha filha e hoje converso sobre ele com meu neto!
Acho que a magia do mundo e a fantasia devem fazer parte essencial da infância! São alimentos da alma!
As ilusões não são más em si e podem ser até valiosas em uma etapa da vida. E, perder ilusões, apesar de doer muito, é parte essencial do processo de crescer. E não acho que para isso se precisa cair num mundo árido, desesperançoso, cinzento, triste. De maneira alguma!!!
O que precisamos é transformar a ilusão em símbolo, em metáfora, em Sentido!
A busca do príncipe ou da princesa encantada precisa ser transformada na busca da gente mesmo, pois como diz Fernando Pessoa “Conta a lenda que dormia – Uma Princesa encantada – A quem só despertaria – Um Infante, que viria – De além do muro da estrada….. Ergue a mão, e encontra hera, E vê que ele mesmo era – A Princesa que dormia”.
E depois, inteiro, poder encontrar o Outro, inteiro.
Aqueles pais perfeitos desejados precisam virar a consciência de que a gente tem que se tornar pai e mãe da gente mesmo e “nos parir” como adultos. Perceber que nunca é tarde para se ter uma infância feliz e que cabe a nós cuidarmos da nossa criança ferida.
A crença numa vida sem sofrimento e perda, tem que virar a crença que tudo pode virar aprendizado e crescimento e que é no enfrentamento das dificuldades que construímos nossa força.
E assim por diante…tirando o sentido literal e concreto das nossas crenças e transformando-as em símbolos.
Isso é tornar-se um ser humano adulto, construindo a própria identidade e virando protagonista da nossa história. E, ao mesmo tempo habitando um mundo com significado!
Então, continuando nessa reflexão, vejo no cerne da crença no Papai Noel (pelo menos na minha crença) uma visão otimista do viver, focada na abundância e não na escassez e no prazer de estar vivo!
Para mim o Papai Noel é a metáfora infantil para a fé na vida!
Texto e ilustração de Cristina Balieiro