Livros, Capra, Campbell e dois momentos mágicos
Os livros sempre foram meus amigos queridos e acima de tudo meus mestres. Muitas vezes eu aprendi mais com eles que com pessoas reais.
Eu leio como se estivesse em um diálogo. O escritor “fala” e eu respondo dentro de mim: refletindo, contestando, ampliando – com surpresa, deleite, às vezes tristeza, maravilhamento – e me transformando. Com muito menor freqüência, durante a leitura de alguns livros tudo isso se intensifica muito e acontecem momentos mágicos!
Momentos divisores de água, momentos em que, como dizia Dom Juan, mestre do Castanheda: “o mundo para”. Lembro muito bem de dois deles.
Era janeiro de 1989, passava férias em Ubatuba e lia O PONTO DE MUTACÃO, de Fritjof Capra. Lembro que estava deitada em uma rede no terraço da casa que alugamos e de repente, lendo a parte sobre a física subatômica, como num insight veio a minha cabeça: “A matéria é descontínua? É composta mais de espaço que substância? O que eu vejo não é verdadeiramente o que existe? Meus sentidos, os sentidos humanos não são confiáveis para detectar a realidade do mundo material???”
O mundo em que eu vivia ruiu nessa hora! Meu sistema de crenças ruiu!
Nunca mais fui a mesma: deixei de achar que existia uma coisa chamada realidade única ou uma verdade absoluta! Descobri que vivia num mundo MUITO mais misterioso, mágico, surpreendente do que poderia supor.
O mundo em que eu vivia mudou!
Agora 2004: para me preparar para coordenar, junto com uma amiga uma Mythological Roundtable de São Paulo (um grupo de estudos sobre a obra de Joseph Campbell, que era organizado pela Ana Figueiredo) li o primeiro volume das MASCARAS DE DEUS – Mitologia Primitiva.
Era para ler só um trecho, mas como sou exagerada li suas quase 400 páginas! E o livro “me fisgou”, me arrebatou, me seduziu!
Ficou reverberando dentro de mim o fato de que o ser humano existe há 60000 anos, e que desde então faz mitologia, se questiona, e o mais incrível, tem as mesmas questões essenciais que praticamente temos até hoje.
“Quem eu sou? De onde vim e para onde vou? O que é a vida? O que é a morte? Qual o significado de tudo isso? Onde está o Sagrado?”
Essas questões são colocadas tanto pelos os caçadores primitivos que deixaram suas perguntas e suas respostas desenhadas em pinturas rupestres nas cavernas, quanto por nós que mandamos sondas para Marte, que somos ligados globalmente por uma rede virtual, que desenvolvemos o projeto Genoma!
Isso me fez ver com humildade nossa imensa igualdade humana. Nossa aventura é coletiva. Apesar da distância no tempo, da distância de crenças, da distância em tecnologia, somos em nosso cerne mais profundo, companheiros de jornada: TODOS! Somos iguais, mistérios vivendo dentro de um grande Mistério!
Isso tirou minha arrogância e me reconectou internamente a toda humanidade.
Mais uma vez o mundo mudou para mim!
Texto de Cristina Balieiro
Lindo seu texto Cristina, muito profundo!
Eu também amo livros, são meus companheiros e meus mestres.
Bjs e ótima semana